Published Texts


Welcome to our publication platform! You can browse and search for stories and samples from all our writers. Thanks to our translators, each story is available in Czech, Dutch, Italian, Polish, Portuguese, Romanian, Serbian, Slovene and Spanish. Throughout the years, this platform is becoming a growing archive of European literature by the future generation of literary artists. We're sharing stories beyond barriers.

O Império Romano em 100 Datas

9  11 de setembro. No final de uma sangrenta batalha que durou mais de três  dias na floresta de Teutoburgo, na Alemanha Setentrional, três legiões  romanas inteiras, comandadas pelo governador Públio Quintílio Varo, são  aniquiladas por uma coligação de populações germânicas chefiada por  Armínio, chefe da tribo dos Queruscos. O choque que a notícia provoca  em Roma é enorme: na sequência da derrota, Augusto decide evacuar  todos os territórios compreendidos entre o Reno e o Elba, conquistados  por Druso e depois por Tibério (os filhos da mulher, Lívia, nascidos do  primeiro casamento com Ti...
Translated from IT to PT by Ana Cristino
Written in IT by Fabio Guidetti

A aprendizagem

Quando construí o primeiro, pensei ter criado uma obra-prima. Como um pintor a terminar o quadro inaugural da sua carreira, que renegará com a mesma veemência com que o perfilhou originalmente. Fi-lo à minha imagem e semelhança e, quando lhe vi vida nos olhos pela primeira vez, foi como se me olhasse ao espelho. Apenas pela dessincronia do reflexo desfiz o equívoco. Não fui módico nas habilidades que lhe dispensei: força, agilidade, espírito combativo, uma extraordinária capacidade estratégica. Ainda assim, levei apenas dez minutos a derrotá-lo. Parecia estar a lutar com uma criança amblíope e...
Written in PT by Valério Romão

Comunhão

— Será aqui?  — No papel está esta morada, não te diz alguma coisa?  — Eu lembro-me disto como um descampado. Teria sido mais fácil  com o nome do restaurante.  — Deu-to quando te ligou.  — Tem de ser aqui. Há muitos carros — respondi, pondo o sinal  intermitente, decidido a estacionar.  — Telefona à tua irmã e tiramos as dúvidas.  — Não o guardei porque pensava que não vínhamos. Nem sequer  conheço a criança.  — Tiveram a gentileza de nos convidar. Pode ser uma boa altura  para tu… Já sabes…  — Já sei. Já sei — interrompi-a, sem vontade de mais reprimendas. — Que horas são?  Luz tirou o conju...
Translated from ES to PT by Matias Gomes
Written in ES by Roberto Osa

Natalya

Assim que soube que o problema era evasão fiscal liguei ao meu  contabilista  ó Zeferino, mas que porra é esta, tu explica-me lá que porra é esta,  disseste-me que tinhas tudo sob controlo, para ignorar as cartas das  finanças que tratavas de tudo, tu explica-me que porra é esta, e à Misé, a quem há apenas dois dias dera um anel de zircónio muito  decente,  temos de devolver a jóia, princesa, depois explico-te  lavei o bucho com dois calmantes e meia garrafa de vodka, estendi-me no  sofá e meti o portátil no chão a vomitar folhas de Excel para que, na  eventualidade de alguém chegar, a minha i...
Written in PT by Valério Romão

Finalmente tens um quarto só para ti

Estou desconfortável, mas sem arriscar mexer-me para não te acordar.  Alongo as costas e atenuo a moinha. Estou meio sentado na borda da  cama, deixando o colchão à tua disposição. Caíste num sono profundo e  aproveito para te afagar os cabelos com meiguice. Não gostas que o faça  quando estás acordado.   Era no sofá que me desforrava. Nos momentos em que quase  adormecias, embalado por um dia de correrias e brincadeiras, punha-te a  ver desenhos animados. Nessa altura, enchia-te de cafunés. Aceitavas os  meus mimos por estares num estado de semiconsciência. Deixavas-te estar,  chuchando ruido...
Written in PT by João Valente

Ponto de fuga

Trata-se da história de um homem que não quer perder o caminho para  casa. Ele é feito de massa de pão. Parte de casa. À medida que vai  caminhando, retira uma migalha de si próprio e deixa-a cair no chão.  Começa por retirar um dos braços. De seguida, as orelhas. O nariz. Mais  tarde, arranca uma parte da barriga, surgindo um buraco. Na cena  seguinte, olhamos através do buraco da barriga do homem. Através do  buraco da barriga dá para ver, à distância, uma casa pequena. Atrás da  janela, vê-se uma mulher idosa à mesa. A mulher encontra-se a amassar  massa de pão. Música comovente. Fim.  Trat...
Translated from NL to PT by Pedro Viegas
Written in NL by Maud Vanhauwaert

Os Seres Vivos

Capítulo 1 A mamã morreu sozinha e devagar. A causa da morte, dizem os médicos,  foi uma intoxicação. A mamã intoxicada. Grande estupidez. Não discuti  com os médicos, limitei-me a assinar os papéis e a tratar do enterro. Se havia  algo que a minha mãe conhecia bem era a sua farmácia. Sempre foi exata  com as doses. Não se enganava. À menina, por enquanto, contamos-lhe a  versão oficial, a da intoxicação. Um dia contar-lhe-ei eu mesma que a avó  dela se suicidou.   A menina esteve presente em todos os momentos, depois de lhe dar  a notícia levámo-la ao tanatório. Esteve colada às minhas perna...
Translated from ES to PT by Matias Gomes
Written in ES by Mariana Torres

O exílio

A cama era como uma caravela que trespassava as águas da noite. Abraçados, ambos tinham a textura de uma onda sombria, iluminada, de vez em quando, por um raio de luz. A caravela flutuava serena e misteriosa, e à volta a paisagem era apenas a infindável extensão das águas, sem que esta fosse assustadora. Tinham-se reencontrado há pouco tempo. Por vezes, jogavam ténis. Às vezes bebiam mesmo uma cerveja depois. Tais camaradagens efémeras aconteciam muitas vezes entre os empregados solitários que tinham sido transferidos para aquela cidade. Geralmente, preferiam transferir solteiros. Contudo, cu...
Translated from RO to PT by Simion Doru Cristea
Written in RO by Anna Kalimar

O nosso pai

O corpo inteiro do meu meio-irmão tomou a forma da sua indiferença. As suas pernas, ligeiramente arqueadas e enfiadas numas calças de ganga desbotadas, acabam em pés que quase não levanta do chão enquanto caminha, pelo que a sua presença é constantemente acompanhada por um som de arrasto dos pés. A parte superior do seu corpo é como um bolo deformado colocado à volta da cintura. Tem ombros curvados para a frente e braços esguios que só levanta quando é mesmo necessário. Mas aquilo que primeiro me salta à vista quando ele surge por trás da porta de casa são as suas sobrancelhas e os cantos da b...
Translated from NL to PT by Pedro Viegas
Written in NL by Lotte Lentes

Depois da Última Ceia

Têm sido dias fantásticos. Morrer é assim, lembro-me de cada minuto. É como se estivesse deitado sobre o mapa do agora, em alto relevo. Estou de costas, para sentir cada pico de montanha, cada vale, todas as planícies. A vida não corre para a frente nem para trás, é só agora, agora, agora. Ao fim de algum tempo sinto uma dor extremamente localizada, tal qual um punhal, e fico extraordinariamente acordado, como no instante em que o juiz me condenou à morte. Morrer é assim, acontece várias vezes, mas uma delas é a definitiva. A sensação de fim pode durar muito tempo, comigo dura desde o anúncio ...
Written in PT by José Gardeazabal

Revolta inversa

A sua vida com Carmen Ottomany começara muito abruptamente nos  finais do décimo primeiro ano. No dia em que tinha decidido deixar a  cidade, procurou uma fulana alta da turma mais próxima, uma tal Fahrida  (o seu pai era do Irão), mas que se apresentava como Frida. Saiu da cidade  pois estava convencido de que ao partir os limites ficariam para trás, uma  convicção absurda, mas se alguém nunca a tiver será digno de piedade. Foi  encontrar a tal Frida entre um grupo de raparigas nas traseiras de um  prédio, fumando e rindo. Fumava-se naqueles tempos, mesmo nos liceus  dos snobes como era o Sub...
Translated from RO to PT by Simion Doru Cristea
Written in RO by Cătălin Pavel

E lá longe Dedos Dez

POLEGAR  Mesmo estando no décimo segundo andar, consegues ouvir o barulho das  obras. Estás a lavar a louça. Rebolaste para fora da cama, vestiste uns boxers  e, de tronco nu e sem meias, começaste a lavar a louça. Como não saiu logo água quente da torneira, esqueceste-te de abrir a torneira da água fria, pelo  que a água ficou demasiado quente, magoando-te as mãos. Quando as tiras   debaixo de água, ficam vermelho-vivas.  A banca está toda coberta de louça suja. Também no chão da cozinha estão  panelas, travessas de vidro e pilhas de pratinhos com requeijão ressequido  nas bordas. O chão da ...
Translated from NL to PT by Xénon Cruz
Written in NL by Joost Oomen

Manobra

É fim de janeiro, um sábado, um ano depois de teres deixado o vaporizador  de arroz em casa dela. Enches duas canecas de café e tiras as fatias de pão da  torradeira. O açucareiro está na penúltima prateleira do armário em cima  do fogão. Quando te esticas para lá chegar, o teu ombro faz um som  enjoativo. Ela levanta os olhos do telefone, que está pousado ao lado dos seus óculos, em cima da mesa de jantar. Pões o açucareiro em cima da mesa,  pedes licença e choras na casa de banho. Se expirares lentamente, quase não  se conseguem ouvir os soluços. Um eco, se tanto. Um segredo que partilhas  c...
Translated from NL to PT by Xénon Cruz
Written in NL by Simone Atangana Bekono

Como pode medir-se o tempo?

Como pode medir-se o tempo? É possível compreender verdadeiramente esta categoria do pensamento e da realidade, que nos escapa continuamente no preciso momento em que procuramos compreendê-la? No nosso mundo, no qual relógios e calendários estão acessíveis em poucos segundos a quem quer que seja, é difícil imaginar o que significaria viver sem saber o momento, a hora, o dia em que se estava. Ainda nos tempos dos nossos avós, apenas os mais ricos e os mais instruídos podiam ler um jornal e ter um relógio de bolso: para aqueles que viviam e trabalhavam no campo, a perceção do passar do tempo era...
Translated from IT to PT by Ana Cristino
Written in IT by Fabio Guidetti

Ortensio

Ele pensa que o mundo é feito de linhas. Não são paralelas, não lhe  importa onde vão encontrar-se. Importa o espaço que as separa, aquilo que  o preenche, o que nasce e o que morre no tempo que as contém, imutáveis  e imaginárias, na solidão de quem as observa.  É uma linha o horizonte que divide o céu do golfo de Santa  Eufémia. Muitas vezes, se o pôr do Sol é límpido, o Stromboli parece mais  próximo. Surge como uma pirâmide quase negra, do cume nasce um ténue  fumo cinzento que Ortensio distingue a custo. É uma linha, aquela  formada pelos seixos que, na margem, antecedem a linha de rebent...
Translated from IT to PT by Ana Cristino
Written in IT by Maurizio Amendola

Residence

Apartamento 11  O MENINO  Aquele menino, olhai bem para ele.  Todos os verões, aquele menino tem mais um ano.  Todos os verões, o castanho dos seus cabelos é aclarado pelo sol num  vermelho ténue, de reflexos claros. Todos os verões, de manhã, enche os  pneus da sua BMX e pedala dentro da Residence, ao longo do muro de  pedra atrás do qual se esconde e espia os da sua idade escoicear uma bola no  campo de terra batida. Gritam palavrões de todo o tipo. Palavrões que o menino nunca disse.  A Residence é composta por dois pequenos edifícios de três pisos,  idênticos. Um o reflexo do outro. A div...
Translated from IT to PT by Ana Cristino
Written in IT by Maurizio Amendola

A Alameda do Amanhecer

Cada homem goza de direitos, porém estes direitos são divinos, e não pode  ser de outro modo, numa última frase, não é obrigatório que esta frase seja  longa nem semelhante a um bilhete de despedida, o que conta é que seja  verdadeira, com uma verdade que a preencha, mesmo que seja a última,  porque a verdade tem o hábito de ser caprichosa, o que não significa que  não exista, existe seguramente e deve ser revelada, mas não num conto, o  conto contém a sua verdade intrínseca, não a mesma da verdade verdadeira  nem menos, mas esta frase é minha por direito para uma história e segui-a  até ao fi...
Translated from RO to PT by Simion Doru Cristea
Written in RO by Andrei Crăciun

Torcidos

Naquela noite chamava-me, e não parecia que fosse parar. — Mamã. Mamã!  Dizia-o assim, oferecendo-o a mim e ao quarto enquanto se encolhia  numa escuridão de cera, cheia de brinquedos (a sua única propriedade).  Voltou a gritar-mo, com muito mais força, e então afastei o olhar e acariciei  o copo de uísque, mesmo debaixo da base, até que a humidade passou para  a ponta do dedo.  A palavra estava bem cosida ao seu cérebro desde bebé.  Fiquei muito quieta enquanto observava a forma brilhante e obsti nada da gota. Não era um crime deixar que aprendesse a sentir frio, ou  como tragá-lo. Imaginava ...
Translated from ES to PT by Matias Gomes
Written in ES by Matías Candeira

O Dilema do Guarda-Chuva Castanho Primeira Porta à Direita Nada

Certo dia, na realidade, foi encontrado um guarda-chuva castanho. Era um  guarda-chuva grande, com um cabo de madeira, sob o qual cabiam duas  pessoas. Residia numa gelataria, num canto empoeirado. Nela habitavam  igualmente algumas aranhas de enormes patas. Certa noite… – era uma  noite de verão – , o chapéu-de-chuva abriu os olhos e decidiu: «Vou-me embora.» Mas não tinha pernas e por isso não podia andar sozinho para  nenhum lado. Alguém teria de o levar.  Como habitualmente, no dia seguinte de manhã, Carl abriu a loja e  sentou-se atrás do balcão, à espera dos clientes. Tinha de ser um dia...
Translated from RO to PT by Simion Doru Cristea
Written in RO by Anna Kalimar

Mas a casa ainda mora em mim

Um batismo. Um novo começo. Uma capa preta por cima dos meus  ombros, como um manto cerimonial. Ela pega na minha cabeça e inclina-a,  cuidadosamente, para trás. A água parece muito mais suave do que a água  do meu duche em casa. As suas pontas dos dedos massajam o meu couro  cabeludo. A minha cabeça. Esta minha cabeça. Esta cabeça sem a qual não posso viver. Esta cabeça pesada. Esta cabeça que se anuncia. Esta cabeça em  que pensamentos. Sempre pensamentos sem aviso prévio. Pensamentos  que nunca cessam. Fecho os olhos e tento imaginar que, juntamente com a  minha cabeça, ela também massaja o...
Translated from NL to PT by Pedro Viegas
Written in NL by Maud Vanhauwaert