Published Texts
Welcome to our publication platform! You can browse and search for stories and samples from all our writers. Thanks to our translators, each story is available in Czech, Dutch, Italian, Polish, Portuguese, Romanian, Serbian, Slovene and Spanish. Throughout the years, this platform is becoming a growing archive of European literature by the future generation of literary artists. We're sharing stories beyond barriers.
A ponte
Todas as estações de comboio têm um relógio. Na verdade, têm mais do que um. Em cima da bilheteira fica o principal. Depois, na gare de embarque, estão os mais pequenos. Os úteis, pois são cúmplices da nossa preguiça em tirar o telemóvel do bolso ou consultar o relógio de pulso.
As crianças ficam fascinadas por estes relógios. Como o ponteiro dos segundos roda sem parar, acaba por ser o único momento em que conseguem ver o tempo a passar. Olham o ponteiro a subir e, à medida que se verticaliza, os seus coraçõezinhos batem mais depressa e os olhos esbugalham-se. Quando, por fim, o indi...
Written in PT by João Valente
Sinopse
A história que comecei a escrever tanto poderá tornar-se parte de uma antologia de contos breves – centrados em diferentes personagens ligadas entre si – como um fragmento de um romance young adult.
Estamos no futuro próximo e, dentro de um chat de pais apreensivos, sucedem-se alarmismos e escândalos, fluindo em catadupa numa comunidade restrita, aparentemente atenta e justa, embora na verdade lívida de invejas e individualismos. Emerge com força – ao desenrolarem-se disputas, mentiras, poses e afirmações de pequenos poderes mesquinhos – a total incompreensão da vida emocional dos filhos por ...
Translated from
IT
to
PT
by Vasco Gato
Written in IT by Arianna Giorgia Bonazzi
Eu não era, mas agora sou. Sensível a qualquer mudança do tempo.
Lá do outro lado do canal levávamos na cara com o vento carregado de flocos de neve, mas depois de atravessar a ponte, já nesta margem, fica-se de costas ao vento, o que torna o processo todo um pouco mais agradável. Desta nova posição a paisagem pode ser contemplada com menos esforço, sem fechar os olhos. O canal ainda não está completamente congelado mas não tarda e o gelo fecha e cobre tudo, é questão de poucos dias. Não há nada a fazer. À primeira parecia ser uma miragem, mas logo se confirmou que havia lá, no meio do canal, um cisne a tentar passar abrindo sempre um caminho na superfície ...
Translated from
SR
to
PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Marija Pavlović
Finalmente tens um quarto só para ti
Estou desconfortável, mas sem arriscar mexer-me para não te acordar. Alongo as costas e atenuo a moinha. Estou meio sentado na borda da cama, deixando o colchão à tua disposição. Caíste num sono profundo e aproveito para te afagar os cabelos com meiguice. Não gostas que o faça quando estás acordado.
Era no sofá que me desforrava. Nos momentos em que quase adormecias, embalado por um dia de correrias e brincadeiras, punha-te a ver desenhos animados. Nessa altura, enchia-te de cafunés. Aceitavas os meus mimos por estares num estado de semiconsciência. Deixavas-te estar, chuchando ruido...
Written in PT by João Valente
Fios
A procura não começa de forma consciente. Sinto-me ligada a ela de uma forma perturbadora, inexplicável, e o seu desaparecimento deixa-me sozinha frente às minhas interrogações. Ao acordar pergunto-me onde dormirá e como vive e continuo a pensar nela, masturbando-me doce e suavemente entre os lençóis enquanto olho para as nuvens pela janela basculante. Quando passo pelas barracas de fruta no nosso bairro, vou tocando nas laranjas com as pontas dos dedos, até que encontro uma que me lembra a sua pele, uma com os poros perfeitos.
Aterrei nas suas aulas de yoga devido às minhas constantes dores ...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Hannah Roels
O regresso
As coisas descarrilaram em agosto, num domingo de manhã, quando os primeiros transeuntes da Place du Parvis Notre-Dame, empregados dos cafés da zona, viram o objeto, algo como uma bala gigantesca assente no solo com a ponta virada em direção à catedral e a parte traseira na direção da esquadra de polícia. Numa primeira estimativa, o projétil media por volta de vinte metros de comprimento e cinco de diâmetro. Os empregados de mesa e de bar aproximaram-se com curiosidade, deram uma volta, encolheram os ombros e foram abrir os restaurantes. Isto foi por volta das sete.
Por volta das oito, os pad...
Translated from
RO
to
PT
by Cristina Visan
Written in RO by Alexandru Potcoavă
Com as aves, partilho o céu
Às vezes, torna-se insuportável. Manducam tão alto que me despertaram. E não só, também discutem quem terá o bocado mais saboroso e não me deixam adormecer. Tudo se ouve, embora haja vidros duplos nas janelas e as esquadrias isolem bem. Um quer sementes de abóbora, outro de linho, porque estalam tão entusiasticamente, os mais pequeninos querem, sôfregos, as migalhas de pão. As fêmeas não querem, de maneira nenhuma, o bolo de sebo. Quem diria que os tordos-comuns, os pintarroxos, os chapins-azuis e os verdilhões não queiram encher o seu aparelho digestivo com absolutamente nada do que lhe...
Translated from
SL
to
PT
by Barbara Jursic
Written in SL by Agata Tomažič
Está tudo bem
Ela leva a sua máquina de café consigo. Ela não sabe quem é. No entanto, sabe, sim, que é uma mulher com uma máquina de café expresso da marca De’Longhi Magnifica S ECAM20.110.B totalmente automática. Preta e cinzenta. Porque já não sabe mais nada, todos os pormenores são importantes. De manhã, assim que a máquina começa a moer os grãos de café com o seu ruído infernal, ela fica logo acordada – e os vizinhos também.
Comprou a máquina em segunda mão no Coolblue e, durante quatro dias, passou as manhãs à espera dela, junto à janela. Ao mesmo tempo que fazia no site, de cinco em cinco minutos,...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Aya Sabi
Os Seres Vivos
Capítulo 1
A mamã morreu sozinha e devagar. A causa da morte, dizem os médicos, foi uma intoxicação. A mamã intoxicada. Grande estupidez. Não discuti com os médicos, limitei-me a assinar os papéis e a tratar do enterro. Se havia algo que a minha mãe conhecia bem era a sua farmácia. Sempre foi exata com as doses. Não se enganava. À menina, por enquanto, contamos-lhe a versão oficial, a da intoxicação. Um dia contar-lhe-ei eu mesma que a avó dela se suicidou.
A menina esteve presente em todos os momentos, depois de lhe dar a notícia levámo-la ao tanatório. Esteve colada às minhas perna...
Translated from
ES
to
PT
by Matias Gomes
Written in ES by Mariana Torres
Clarões
Numa coletânea de ensaios intitulada O Zen e a Arte da Escrita, Ray Bradbury escreve que, dos vinte e quatro aos trinta e seis anos, passou o tempo a anotar listas de substantivos. A lista dizia mais ou menos assim:
O LAGO. A NOITE. OS GRILOS. A RAVINA. O SÓTÃO. O RÉS DO CHÃO. O ALÇAPÃO. A CRIANÇA. A MULTIDÃO. O COMBOIO NOTURNO. A SIRENE DOS NEVOEIROS. A FOICE. O CARNAVAL. O CARROSSEL. O ANÃO. O LABIRINTO DE ESPELHOS. O ESQUELETO.
Ultimamente, aconteceu-me uma coisa semelhante.
Vivi numa família que me proporcionou uma boa educação e uma boa forma de estar no mundo, mas ultimamente tenho pe...
Translated from
IT
to
PT
by Vasco Gato
Written in IT by Sara Micello
Um Anjo
– Xiu, olha, lá vem.
Os homens sustêm o fôlego, imobilizados, contra a arcada. Pela sua frente passa uma mulher com uma capa verde, mala, sapatos e luvas de pele de serpente. Os saltos altos transmitem um som agudo e do seu cabelo preso ao alto caem algumas madeixas. O passeio está cheio de gente que vem das compras, e a mulher sobressai, discordante, com o seu luxo fora do comum. Porém, ninguém lhe assobia, até mesmo algumas pessoas lhe dão passagem ao chegar.
– Lá vem ela agora – murmura o homem mais velho, e os dois furam atrás dela.
Seguem-na a uma distância suficientemente grand...
Translated from
RO
to
PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Anna Kalimar
Expedição do fogo de artifício
Eis uma passagem do primeiro capítulo "Reunindo forças para a fuga", da novela-reportagem “Expedição ao fogo de artifício”, ou “A respeito da União Europeia e dos jovens”, a qual será publicada ainda este ano pela Editora Petr Štengl.
(...) Por falta de experiência, entrei no clube logo após a abertura, quando a malta estava ainda apenas ganhando ânimo nos bares vizinhos. Até agora, só os efeitos de luz deambulavam pelo chão deserto, e o techno-set introdutório do DJ lembrava mais os mantras de um monge budista do que qualquer coisa satânica. Pelo reflexo húmido do chão, era óbvio que meia ho...
Translated from
CZ
to
PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Ondrej Macl
O exílio
A cama era como uma caravela que trespassava as águas da noite. Abraçados, ambos tinham a textura de uma onda sombria, iluminada, de vez em quando, por um raio de luz. A caravela flutuava serena e misteriosa, e à volta a paisagem era apenas a infindável extensão das águas, sem que esta fosse assustadora. Tinham-se reencontrado há pouco tempo.
Por vezes, jogavam ténis. Às vezes bebiam mesmo uma cerveja depois. Tais camaradagens efémeras aconteciam muitas vezes entre os empregados solitários que tinham sido transferidos para aquela cidade. Geralmente, preferiam transferir solteiros. Contudo, cu...
Translated from
RO
to
PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Anna Kalimar
Mudança
— Apanhe o elevador, eu vou a correr pelas escadas — grita o jovem médico descendo rapidamente escada abaixo, saltando vários degraus de uma vez. Não conseguir não é uma opção.
Algumas semanas atrás, ainda no puerpério, a mãe relatou ao pediatra: o bebé não para de chorar. Na primeira consulta ouviu: amamente-o bem e vai acalmar-se. Na segunda clínica ouve: são cólicas, deixe de comer fritos, a qualidade do leite vai melhorar e o bebé vai deixar de chorar tanto.
No gabinete privado, o médico pôs-se a rir:
— Porque não haveria de chorar? É um bebé.
Os pediatras estavam calmos, mas o choro d...
Translated from
PL
to
PT
by Katarzyna Ulma Lechner
Written in PL by Joanna Gierak Onoszko
Perguntem ao Relâmpago
Não era a minha intenção causar um burburinho. Mas de repente assim foi. Falei na escola sobre o acidente de viação e uma coisa levou à outra. Estava pela ponta dos cabelos com os exames, de maneira que nunca conseguia acordar a horas, embora me propusesse sempre na véspera de cada prova a folhear atentamente tudo aquilo que ainda não tinha aprendido. Depois do bipe irritante do despertador da minha mãe, que tinha de estar bem mais cedo no emprego, voltava sempre a cair num sono profundo, tão profundo que mal ouvia o meu próprio alarme. O meu pai vinha-me então tirar do ninho mesmo a te...
Translated from
NL
to
PT
by Xénon Cruz
Written in NL by Carmien Michels
O metro
Na segunda-feira de manhã ouvi o metro chegar à estação no momento em que introduzia o bilhete na máquina e, embora ainda não estivesse atrasado e mesmo que estivesse, não havia problema, embora estivesse abraçado pelo desejo absoluto de apanhar aquele metro, um desejo não tanto como uma vontade, mas como um anseio bizarro de vingança, lançou-se pelas escadas abaixo. Aconteceu algo muito curioso. Assim como se diz que quando se morre, toda a vida te passa pela frente dos olhos, naqueles breves segundos de que precisou T. para saltar os degraus, toda a sua vida lhe passou pela mente a uma veloc...
Translated from
RO
to
PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Cătălin Pavel
O tempo é um circo
De madrugada, sonhou com um crime cometido sob uma amendoeira e quatro bilhetes de lotaria, todos sem prémio. Era domingo.
No sonho, o jovem médico chorou e despertou com as bochechas húmidas, abraçado por uma tristeza púrpura. Come sem apetite, veste-se de luto e espera pelo telefonema que deveria confirmar quem morreu nessa noite.
O seu avô nascera perto do início do século XX num mundo demasiado longínquo para que as pessoas tivessem mantido algumas fotografias dele.
O pai do seu avô tinha falecido trinta anos antes do jovem médico nascer. Ele vinha de um tempo ainda mais antigo, quando os ...
Translated from
RO
to
PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Andrei Crăciun
Parêntesis
Suponho que nem o que temos de mais fiável - os sentidos, isto é, o que vemos, ouvimos, aquilo de que nos apercebemos com o corpo - é fiável em situações como a morte de um pai, o nascimento de um filho ou estar prestes a morrer atropelado. Agora, que já enterrámos o papá, e estou por fim sozinho com os meus pensamentos, constato que ontem, no tanatório, tal como há trinta anos atrás, o tempo parou. Por uns segundos, sim. Mas aconteceu outra vez. E soube, imediatamente, que se tratava do mesmo fenómeno que vivi em criança.
Naquela noite também estava com o papá.
Aconteceu...
Translated from
ES
to
PT
by Matias Gomes
Written in ES by Mariana Torres
Estação de tratamento
Vagueava defronte de um aglomerado de dormitórios do estaleiro, esfregando as suas mãos frias. Ao longe, dois corvos-marinhos cintilavam por cima do rio. Pouco depois, ela começou a olhar em todas as direções e a verificar a mensagem de texto que chegara ontem. “Olá Petra, ação ETAR amanhã às oito. Encontro frente à ponte junto do aglomerado. A.” Ela leu-o mais três vezes antes de a luz do visor se apagar.
A antiga e a nova estação de tratamento que partilhavam os resíduos vindos de toda a cidade ficavam uma atrás da outra na ilha, tal como governadores do rio. Enquanto a mais antiga se ergui...
Translated from
CZ
to
PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Anna Háblová
Mesmo Que apenas Uma só Gota Possa Ser Vista
The white cracker who wrote the national anthem knew what he was doing. He set the world “free” to a note so high nobody can reach it. That was deliberate. Angels in America,
Tony Kushner
O meu pai e eu íamos a caminho do aeroporto. Eu ia passar um mês aos Estados Unidos e ele fazia questão de se despedir de mim lá. Ia a Charleston, uma pequena cidade no litoral da Carolina do Sul. O meu pai perguntou-me como é que a cidade era, e eu apercebi-me, nessa altura, de que não tinha ido à procura de quaisquer imagens no Google. A única coisa que sabia é que tinha havido um tiroteio na cave ...
Translated from
NL
to
PT
by Pedro Viegas
Written in NL by Rebekka de Wit