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- "Cum se poate măsura timpul?" translated to RO by Nicoleta Iolanda Rus,
- "Medir el tiempo en la Antigüedad" translated to ES by Paula Caballero,
- "Tijdmeters in de oudheid" translated to NL by Lies Lavrijsen,
Como pode medir-se o tempo?
Como pode medir-se o tempo? É possível compreender verdadeiramente esta categoria do pensamento e da realidade, que nos escapa continuamente no preciso momento em que procuramos compreendê-la? No nosso mundo, no qual relógios e calendários estão acessíveis em poucos segundos a quem quer que seja, é difícil imaginar o que significaria viver sem saber o momento, a hora, o dia em que se estava. Ainda nos tempos dos nossos avós, apenas os mais ricos e os mais instruídos podiam ler um jornal e ter um relógio de bolso: para aqueles que viviam e trabalhavam no campo, a perceção do passar do tempo era medida pelo repicar dos sinos e pelo calendário das festas religiosas. O que permitiu ao homem medir o tempo foi, de facto, o reconhecimento do seu carácter cíclico: é pelo menos a partir da revolução neolítica, quando, há mais de dez mil anos, as comunidades humanas começaram a cultivar a terra, que a medição do tempo se baseia na periodicidade dos fenómenos naturais. Entre estes, um lugar de destaque é ocupado pelos fenómenos astronómicos, como a alternância do dia e da noite e a diferente altura do sol no céu em função das estações: esta última, em particular, influenciando as condições climáticas e as variações de temperatura, determina a renovação anual da vegetação e a sequência dos trabalhos agrícolas.
A conexão entre o movimento regular dos corpos celestes e a alteração das condições climáticas era certamente observada desde a mais remota antiguidade; e desde os alvores da civilização o homem esforçou-se para compreender este movimento, para prever as mudanças de estação e estabelecer o calendário dos trabalhos agrícolas. A julgar pelos materiais arqueológicos conservados, foram sobretudo as civilizações mesopotâmicas que registaram durante séculos uma enorme quantidade de observações astronómicas. Os Babilónios estudaram em particular o movimento dos planetas, procurando determinar a sua periodicidade: a partir pelo menos da metade do século VIII a.C., desenvolveram um sistema de observações, apoiado provavelmente pela própria autoridade estatal, que assegurou o registo dos movimentos planetários em intervalos regulares. O testemunho principal da observação do céu na Mesopotâmia é-nos fornecido pelos denominados “diários astronómicos babilónicos”, uma série de tabuinhas de argila provenientes de diversos sítios arqueológicos no Iraque dos nossos dias e hoje conservadas no British Museum: os textos nelas contidos abrangem um período de quase 600 anos, entre meados do século VII e meados do século I a.C. Mas estes dados circularam também para além dos arquivos babilónicos: eram ainda utilizados no século II d.C. pelo astrónomo romano Cláudio Ptolomeu, que, para encontrar a datação absoluta dos eventos astronómicos do passado, utilizava a denominada ‘era de Nabonassar’, a partir do nome do soberano babilónio (R.do 747-734 a.C.) em cuja época começaram a surgir os primeiros registos. Graças à observação de tais fenómenos no espaço de séculos, os astrónomos babilónios puderam identificar a periodicidade do movimento dos planetas e calcular os momentos dos seus aparecimentos futuros, um resultado fundamental sobretudo para a formulação de previsões astrológicas.
Não podemos saber se estas observações tiveram como consequência também a elaboração, pelos Babilónios, de teorias que procurassem explicar como funcionava o movimento dos corpos celestes. É-nos possível reconstruir esse desenvolvimento apenas através do mundo grego, em particular no âmbito da escola jónica, uma escola filosófica que floresceu no século VI a.C. nos territórios da Grécia oriental. Nessa época, as cidades gregas da Jónia eram controladas pelo reino da Lídia, que dominava a Anatólia ocidental, e foram precisamente as estreitas relações com o interior asiático que lhes garantiram maiores possibilidades de intercâmbio com as civilizações do Próximo Oriente, em âmbito tanto comercial como cultural e científico. Os próprios Gregos reconheciam esta dívida: o historiador Heródoto de Halicarnasso, que viveu um século mais tarde mas cresceu no mesmo ambiente cultural, reconheceu explicitamente (no livro II das Histórias, § 109) que os Gregos tinham aprendido a geometria com os Egípcios e a astronomia com os Babilónios. Estas duas disciplinas eram entendidas por Heródoto antes de mais em sentido prático: a geometria é a ciência que se ocupa da medição do espaço, particularmente desenvolvida no Egipto para dar resposta às necessidades de redescobrir as divisões de propriedade depois das cheias do Nilo; a astronomia é a ciência que se ocupa da medição do tempo, através de aparelhos concretos (o polo e o gnómon) e instrumentos conceptuais (a divisão do dia e da noite em doze horas), cuja invenção Heródoto atribui à civilização mesopotâmica.
Um dado sobre o qual vale a pena determo-nos é a simplicidade dos instrumentos astronómicos mencionados por Heródoto. O gnómon, por exemplo, não era mais do que um bastão cravado no chão em posição perpendicular ao solo, e cuja sombra, diminuindo durante a manhã e alongando-se de novo à tarde, permitia seguir o movimento do sol no céu e assim medir as horas diurnas: o próprio nome, derivado do verbo ‘conhecer’, significa precisamente ‘artefacto que permite conhecer’ o tempo. O polo, por sua vez, cujo nome indica o ‘perno’ de uma rotação, era um vaso de forma hemisférica que, colocado em posição horizontal, era usado como imagem especular da abóbada celeste: combinando o polo com o gnómon, ou seja, fixando um bastão alinhado com o centro do vaso, o resultado que se obtinha era a extremidade da sombra do bastão, projetada na superfície interna do vaso, reproduzir especularmente o movimento do sol no céu diurno. A combinação de polo e gnómon funciona, portanto, segundo o mesmo princípio de um relógio solar ou meridiana. O testemunho de Heródoto garante-nos que estes instrumentos não eram novas invenções, sendo já utilizados pelos Babilónios para a medição do tempo. Mas com a introdução de tais instrumentos no mundo grego, estas operações científicas alcançaram um desenvolvimento inesperado: e, numa sociedade altamente tecnológica como a nossa, causa enorme admiração observar como os filósofos jónicos conseguiram elaborar modelos teóricos de notável complexidade empregando apenas estes instrumentos elementares.
Anaximandro de Mileto, que viveu na primeira metade do século VI a.C., é o primeiro filósofo ocidental a quem as fontes atribuem a elaboração de um modelo teórico da estrutura do universo, ao qual estão também associadas as primeiras verdadeiras medições astronómicas. De Anaximandro, como de todos os filósofos gregos anteriores a Platão, não nos chegou nenhum testemunho direto: o que dele sabemos devemo-lo aos chamados doxógrafos, autores que viveram vários séculos mais tarde, nas épocas do Império Romano ou da Antiguidade Tardia, que procuraram recuperar os testemunhos do pensamento destes filósofos antiquíssimos, muitas vezes extraindo-os não diretamente das suas obras mas de compêndios pré-existentes. De acordo com o que podemos reconstruir com base em tais fontes, a principal novidade da abordagem de Anaximandro, que distinguirá posteriormente toda a tradição astronómica grega e romana, era representada pelo facto de se basear em fundamentos geométricos e não aritméticos: por outras palavras, em vez de simplesmente registar as observações, contando o número de dias nos quais um planeta permanecia visível ou invisível, Anaximandro elaborou um modelo geométrico que descrevesse o movimento dos corpos celestes, procurando compreender as suas modalidades e tempos. Pode por isso ser considerado o inventor do modelo geocêntrico do universo, baseado na ideia de que os corpos celestes se movem num movimento circular uniforme em torno da Terra, imóvel no centro do sistema.
Segundo o doxógrafo Diógenes Laércio, que viveu no século III d.C. (Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres, livro II, § 1), Anaximandro imaginava a Terra como uma esfera colocada no centro do universo: com base em tal pressuposto, utilizou a sombra do gnómon para realizar medições astronómicas que permitissem estabelecer com precisão os momentos dos solstícios e dos equinócios, e assim a duração das estações. Uma vez cravado o gnómon no chão, a observação da sua sombra permite seguir o movimento aparente do sol: assinalando, a intervalos de tempo regulares, os pontos correspondentes à extremidade da sombra, podem traçar-se linhas de trajetória parabólica, que representam a projeção na terra do percurso do sol no céu. O meio-dia solar, ou seja, o ponto no qual o sol está mais alto, corresponde naturalmente ao momento em que a sombra do gnómon é mais curta e virada para o polo norte celeste (isto é, coincide com o meridiano local). Uma vez estabelecida a posição da sombra meridiana, Anaximandro mediu as variações do seu comprimento dia a dia: deste modo, pôde examinar as alterações da posição do sol, não apenas durante o dia, mas também ao longo do ano. Anaximandro observou que a sombra do gnómon diminui ou alonga-se numa base não apenas diária, mas também anual, alcançando um comprimento máximo no inverno e um comprimento mínimo no verão. Que o sol estivesse mais baixo no inverno e mais alto no verão já era obviamente património da consciência comum há milénios: o salto de qualidade representado por Anaximandro consistiu na medição experimental desta variação, conduzindo a resultados importantes sobre o céu e sobre os corpos celestes. Medindo as variações da sombra meridiana, Anaximandro identificou, de facto, os dois momentos precisos em que a trajetória do sol começa a deslocar-se de norte para sul e vice-versa: estes dois momentos foram designados ‘pontos de viragem’ (em grego, tropé) no movimento anual do sol, e aos círculos ao longo dos quais se desenrolava o movimento diurno do mesmo astro em correspondência com estes dois momentos foi dado o nome de ‘trópicos’.
Pelo procedimento aqui descrito compreende-se a relativa simplicidade das medidas tomadas por Anaximandro, fazendo uso de instrumentos antigos e dando pela primeira vez uma objetividade matemática a conhecimentos que já eram património comum há milénios. A principal inovação de Anaximandro, e da ciência grega em geral, na verdade não foi a construção de novos instrumentos ou a maior precisão das medições, mas a construção de um novo modelo teórico que será posteriormente consolidado com o nome de ‘modelo geocêntrico’: uma representação mental do universo, na qual os movimentos dos corpos celestes são projetados na superfície interna de uma esfera de grandeza infinita, ou antes, de uma esfera de tal modo grande que relativamente a ela a Terra se revela infinitamente pequena, a ponto de poder ser assimilada, na construção geométrica, a um ponto. Foi precisamente esta nova representação mental que permitiu aos filósofos jónicos dar um enorme passo em frente em relação à tradição babilónica, lançando de facto as bases da astronomia e geografia científicas como ainda hoje as entendemos. O modelo geocêntrico apresentava, de facto, uma vantagem extraordinária: a de permitir finalmente uma medição precisa do carácter cíclico dos fenómenos celestes, expressa já não em termos absolutos, através de números e períodos (como no registo das observações astronómicas babilónicas), mas em termos relativos, como porções de um movimento circular. A astronomia e a geografia gregas e romanas baseiam-se no cálculo de distâncias angulares, expressas segundo o sistema sexagesimal herdado da tradição babilónica. A principal consequência da utilização das distâncias angulares era a de poder transferir as grandezas (relações, proporções, ângulos) medidas sobre a terra, dentro de um pequeno vaso hemisférico, para os espaços infinitamente grandes do universo, mantendo, obviamente, não o seu valor numérico mas as suas proporções recíprocas. As distâncias entre os círculos celestes, a posição do sol nos diversos períodos no ano e as latitudes geográficas foram todas medidas com um bastão e um vaso, e daí transferidas, mediante gráficos geométricos desenhados em folhas de papiro, para as grandezas incomensuráveis do cosmos. Nasceram assim os conceitos basilares da astronomia e da geografia gregas (o equador, os trópicos, os polos, a latitude e muitos outros) que continuam em uso ainda hoje, sobrevivendo sem problemas ao abandono do modelo geocêntrico no âmbito do qual tinham sido inventados. A força de tal modelo, na verdade (como explicita Ptolomeu nos capítulos introdutórios do Almagesto), era precisamente a de ser uma construção teórica, elaborada para medir os movimentos dos corpos celestes e não para avançar hipóteses sobre a sua natureza. Paradoxalmente, Copérnico e Galileu interpretaram o geocentrismo por aquilo que de facto era, precisamente um modelo, que podia (e devia) ser melhorado: demostraram ter compreendido perfeitamente a natureza, muito melhor do que os seus mais estrénuos defensores. Embora hoje saibamos que os corpos celestes se movem de modo diferente e obedecem a outras leis, a base dos nossos sistemas de referência astronómicos e geográficos permaneceu a mesma: uma projeção esférica inventada há mais de 2500 anos por pessoas de extraordinária capacidade intuitiva, cujo único instrumento científico era um bastão cravado no chão.