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Welcome to our publication platform! You can browse and search for stories and samples from all our writers. Thanks to our translators, each story is available in Czech, Dutch, Italian, Polish, Portuguese, Romanian, Serbian, Slovene and Spanish. Throughout the years, this platform is becoming a growing archive of European literature by the future generation of literary artists. We're sharing stories beyond barriers.
A ranhura do zangão
O dia zero
Os seus dedos deslizaram quase automaticamente até ao telemóvel, que pousou ao pé do prato da sopa. Não que esperasse que no ecrã aparecesse algo excitante, mas os velhos hábitos são difíceis de esquecer... De cada vez que veio passar alguns dias a casa, preferiu desativar a aplicação web de encontros. E ainda não saberia dizer se o fez por si se pela sua família – dado que se sentia desconfortável em deixá-los embaraçados –, ou se o fez para se proteger do desconforto de segunda mão: não suportaria que por entre os perfis avistasse as nicks deploráveis e as lamentáveis e meio dis...
Translated from
SL
to
PT
by Barbara Jursic
Written in SL by Agata Tomažič
Sempre vivemos nesta aldeia
Mudámos de pele. Digo-o a mim mesma em frente ao espelho de água que o tanque nos proporciona. Já não existem vacas na aldeia, pelo que este bebedouro é nosso, como quase tudo o que nos rodeia. Nosso e de ninguém. Património das que resistem e residem. A minha filha, que tem restos de lama e folhas secas no cabelo, agarra-se ao meu corpo como um animalzinho. Há muito tempo que não usamos o carrinho de bebé porque os caminhos de pedra estragam-no e os meus músculos habituaram-se a ela, ao seu peso e aos seus contornos, adquirindo contornos novos, atléticos, impensáveis. Já não sou uma mulher ma...
Translated from
ES
to
PT
by Miguel Martins
Written in ES by Aixa De la Cruz Regúlez
Sónia levanta a mão
Por estes lados, as pessoas são muito desconfiadas. Mas não se sabe se noutros sítios a iriam receber de braços abertos. As pessoas do lado dele. Os do outro grupo. Não conhece, no círculo dela, casais das gerações anteriores, em que os dois sejam amigos, e não inimigos, mesmo que fiquem juntos até à velhice. Algures no mundo talvez existam os que ainda ficam amigos a vida toda e para além dela, mas são poucos, extremamente sortudos e bem escondidos aos olhos dos outros, de tal forma, que, olhando à tua volta, tu, jovem, possas estar quase convencido de que quem está ao teu lado chegará a dest...
Translated from
RO
to
PT
by Cristina Visan
Written in RO by Lavinia Braniște
Elogio do Furacão
Apreciei sempre a violência do quotidiano: por exemplo, a de um copo que se parte na escuridão. Às vezes, pergunto-me se essa memória é realmente minha. Revivo a cena com uma alegria difícil de conter: o objeto que cai e se desintegra e se torna estrépito surdo e logo tumulto de vozes a meio da noite. A minha mãe carrega no interruptor para iluminar os vidros espalhados. A sua mão aberta no ar, por cima de mim. O som da bofetada que não se parece, de modo algum, com o som do vidro contra o chão e a sensação de compreender que tudo faz parte da cerimónia. A violência que principia com um copo e...
Translated from
ES
to
PT
by Miguel Martins
Written in ES by Alejandro Morellón Mariano
O regresso
As coisas descarrilaram em agosto, num domingo de manhã, quando os primeiros transeuntes da Place du Parvis Notre-Dame, empregados dos cafés da zona, viram o objeto, algo como uma bala gigantesca assente no solo com a ponta virada em direção à catedral e a parte traseira na direção da esquadra de polícia. Numa primeira estimativa, o projétil media por volta de vinte metros de comprimento e cinco de diâmetro. Os empregados de mesa e de bar aproximaram-se com curiosidade, deram uma volta, encolheram os ombros e foram abrir os restaurantes. Isto foi por volta das sete.
Por volta das oito, os pad...
Translated from
RO
to
PT
by Cristina Visan
Written in RO by Alexandru Potcoavă
Um carro da Grécia antiga
Era um dia quente de junho. Só que não se dizia junho, mas antes Thargelion ou Skirophorion. As duas figuras saíram das muralhas de Atenas e, em amena conversa, dirigiram-se, ao longo do rio Ilissus para o campo. Falavam sobretudo de amor.
O mais novo dos dois, o jovem, levava consigo uma transcrição do discurso de outra pessoa sobre o amor ser o mal, e ele até acreditava nisso. Na verdade, ele falava apenas desse discurso de outra pessoa. O homem mais velho discordou com ele mentalmente, mas deixou-se levar pela paixão do jovem. E assim pararam debaixo de um grande plátano onde o mais velh...
Translated from
CZ
to
PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Ondrej Macl
Sinopse
A história que comecei a escrever tanto poderá tornar-se parte de uma antologia de contos breves – centrados em diferentes personagens ligadas entre si – como um fragmento de um romance young adult.
Estamos no futuro próximo e, dentro de um chat de pais apreensivos, sucedem-se alarmismos e escândalos, fluindo em catadupa numa comunidade restrita, aparentemente atenta e justa, embora na verdade lívida de invejas e individualismos. Emerge com força – ao desenrolarem-se disputas, mentiras, poses e afirmações de pequenos poderes mesquinhos – a total incompreensão da vida emocional dos filhos por ...
Translated from
IT
to
PT
by Vasco Gato
Written in IT by Arianna Giorgia Bonazzi
Esmeralda da depressão
ESMERALDA
Velas, em vez de candeeiros. Baldes, em vez de bidés. Abortos acidentais, legais e com fartura.
Era a Idade Média e dava-se mais um parto caseiro. Feliz, nasceu luz e tratava-se da primeira menina com olhos azuis. A primeira vez, nascidos na terra, por debaixo do céu celeste, oculares tons do que está por cima, e não por baixo. O primeiro milagre da estética, os olhos castanhos e/ou pretos do reino nunca tinham visto nada assim.
A senhora veio à rua. Trazia hortaliças biológicas numa mão, o recém-nascido na outra. Queria chegar à Igreja para mostrar aquilo, talvez o padre soubess...
Written in PT by Luis Brito
A Ilha
Até hoje não sei bem o que estava a fazer nas ilhas. De que estava à procura? Sei só o que deixei para trás. O país que me deu o passaporte. A mulher que me deu a vida. Tantas coisas que podia comprar com dinheiro. O mundo que eu não conseguia e não sabia mudar.
A água do mar estava morna. Ao anoitecer, as ondas resplandeciam repletas de plâncton. Depois de tantos anos de viagem, já não sabia reconhecer bem as docas entre palmares onde normalmente costumava apanhar os sucessivos barcos. Fiquei confusa com os nomes das ilhas, todos começados por palavras como koh e nusa. Fiquei confusa com os...
Translated from
PL
to
PT
by Katarzyna Ulma Lechner
Written in PL by Urszula Jabłońska
Pássaros que cantam o futuro
Parece uma mistura impossível de coruja, morcego, pinguim e texugo; tem a pelagem azul, os olhos grandes e vermelhos, o bico amarelo; não tem mãos mas sim duas asas pequenas que se acionam ao ligá-lo.
Feliz aniversário, diz ela.
Noa pensa que a compra valeu a pena, ainda que tenha ultrapassado um pouco o seu orçamento. Precisou de dez mesadas para reunir o dinheiro mas, agora, ao vê-lo a ele tão entusiasmado, alegra-se por ter renunciado ao cinema, ao parque de diversões e, inclusivamente, à pista de bólingue das Sextas-feiras com as suas amigas.
Daniel segura o boneco como se fosse algo v...
Translated from
ES
to
PT
by Miguel Martins
Written in ES by Alejandro Morellón Mariano
Com as aves, partilho o céu
Às vezes, torna-se insuportável. Manducam tão alto que me despertaram. E não só, também discutem quem terá o bocado mais saboroso e não me deixam adormecer. Tudo se ouve, embora haja vidros duplos nas janelas e as esquadrias isolem bem. Um quer sementes de abóbora, outro de linho, porque estalam tão entusiasticamente, os mais pequeninos querem, sôfregos, as migalhas de pão. As fêmeas não querem, de maneira nenhuma, o bolo de sebo. Quem diria que os tordos-comuns, os pintarroxos, os chapins-azuis e os verdilhões não queiram encher o seu aparelho digestivo com absolutamente nada do que lhe...
Translated from
SL
to
PT
by Barbara Jursic
Written in SL by Agata Tomažič
Diário da Vida
17
22 de dezembro de 2014. Diário da Vida
A aparência irreal da Praça de Espanha na fotografia impressionava com magnificência da civilização anterior já despida do seu sentido. Para que é que uma potência colonial necessita de uma praça tão tamanha, concebida para as festividades de outrora, decorada com os nichos pretensiosamente dedicados cada um a uma província espanhola? As carruagens circulavam ao redor da fonte, oferecendo aos turistas uma amostra barata da pompa da nobreza antiga. Pelo menos não se veem os segways por aqui. Um cavalo aproveitou-se do descuido do cocheiro, ...
Translated from
SR
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PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Marija Pavlović
Mudança
— Apanhe o elevador, eu vou a correr pelas escadas — grita o jovem médico descendo rapidamente escada abaixo, saltando vários degraus de uma vez. Não conseguir não é uma opção.
Algumas semanas atrás, ainda no puerpério, a mãe relatou ao pediatra: o bebé não para de chorar. Na primeira consulta ouviu: amamente-o bem e vai acalmar-se. Na segunda clínica ouve: são cólicas, deixe de comer fritos, a qualidade do leite vai melhorar e o bebé vai deixar de chorar tanto.
No gabinete privado, o médico pôs-se a rir:
— Porque não haveria de chorar? É um bebé.
Os pediatras estavam calmos, mas o choro d...
Translated from
PL
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PT
by Katarzyna Ulma Lechner
Written in PL by Joanna Gierak Onoszko
Não quero ser um cão
Escrevo no teclado: «PÔR FIM A UM DESGOSTO DE AMOR». Vejo histórias de pessoas mas não quero histórias. Quero soluções, não quero compaixão. Isto tem de parar agora. «TRANSFORMAÇÃO», escrevo. O Google diz que há transformação na matemática e na genética. Opto pela segunda e com isto faço a minha primeira escolha. Estou farta deste corpo que já foi beijado por demasiadas pessoas, que talvez até esteja estragado. Tenho sido muito imprudente com ele, demasiado descomprometida, tem de acabar, tem de ser outro e melhor. Transformação genética. «Cura com sumos» aparece no ecrã. «Transforma-te numa v...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Alma Mathijsen
O reencontro
Já chega. Arrumei as malas, o fato na capa, a calçadeira de sapatos e entreguei a chave. Até casa tenho de conduzir durante seis horas, mas o caminho de regresso é mais curto. Abri a janela e, com a cabeça de fora, atravesso cada vez mais rápido a avenida principal da cidade. No fresco da noite e da velocidade, o ar corta-me a face e isso recorda-me a aspereza da esponja desmaquilhante. Tenho uma tez sensível e não suporto com facilidade o tratamento que os apresentadores do noticiário têm de fazer para não se parecerem com uma lua cheia de brilho – é-lhes aplicada uma camada de base em pó, qu...
Translated from
RO
to
PT
by Cristina Visan
Written in RO by Alexandru Potcoavă
A Aguardente que mata
DE LIVRO DE CONTOS: A AGUARDENTE QUE MATA
DISCLAIMER: Os seguintes excertos são de um livro de contos composto por seis ciclos (Uma notícia incomum, As aves não sobrevoam os subúrbios, Os esboços do minibus, A aguardente que mata, Pela boca, Fizeram bem em bombardear-nos). Cada um dos ciclos contém cinco contos. Os contos condensam os protagonistas e os acontecimentos, e entrelaçam-se entre si no espaço.
CICLO AS AVES NÃO SOBREVOAM OS SUBÚRBIOS
As Casas da cultura nas terras pequenas foram todas convertidas em lojas. Em frente delas há sempre três ou quatro homens de chinelos abibas d...
Translated from
SR
to
PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Ana Marija Grbic
Todas as pessoas se tornam irmãos
Quando vi o Andrei afastar-se, comecei a gostar dele. Vi a sua mochila preta a abarrotar que ele transportava como um escudo sobre as costas. A mochila estava tão cheia que se percebia logo que ele não estava a caminho de nada, que não ia a lado nenhum. Se tivesse ido para as montanhas assim, a mochila ia desequilibrá-lo, podia puxá-lo para trás, e lançá-lo no abismo. Os fechos éclair da mochila estavam velhos e parecia que iam rebentar a qualquer momento. Eu imaginava que a mochila ia abrir-se de repente, como um airbag, uma almofada de ar que começava a crescer, cada vez maior, e que se tran...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Yelena Schmitz
Calcário
Ora, está visto que leva muito tempo para uma cabeça de chuveiro ficar entupida com calcário. Agora que me balanço aqui, com o tubo do chuveiro enrolado à volta do pescoço, meio pendurado no corredor, meio pendurado por cima das escadas, penso: se todos os meus amigos tivessem visto a casa de banho, tinham percebido logo. Se todos tivessem subido uma única vez ao andar de cima, como fez a Ema naquela tarde, teriam olhado para a cabeça de chuveiro, teriam aberto e fechado a torneira, teriam visto a divisória de vidro calcificada do duche, teriam reparado nos pelos da barba feita à pressa no lav...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Lisa Weeda
Linguado
Flutuo com a cara dentro da água, sem me mexer. Não chamar a atenção, não gastar energia. Simplesmente boiar. Expirar lentamente, muito lentamente. Pequenas bolhas que me fazem cócegas nas faces quando sobem.
No último momento o meu corpo vai estremecer, a barriga vai encolher-se para forçar a boca a abrir-se e, nesse momento, vou levantar resoluta e calmamente a cabeça para fora da água e engolir uma grande golfada de ar.
Ninguém dirá «72 segundos!»
É um talento que não nos leva a lado nenhum na vida. Quando muito, mais perto de nós próprios.
Estou sentada no fundo da piscina e olho para ...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Nikki Dekker
O Marcador
Primeiro, Robert fica sozinho no sofá, à esquerda da mancha que há uns meses Sven fez com um marcador vermelho. Ele pergunta como é que estou, se as farmácias e as lojas estão abertas, se tenho tudo o que preciso, o que é que vou fazer se acontecer alguma coisa. Estou bem, estão abertas, tenho tudo, não se vai passar nada. Todos os dias ele pergunta as mesmas coisas, todos os dias eu respondo-lhe o mesmo. Aqui nada acontece depois das cinco da tarde. Queria também acrescentar: O propósito do confinamento é que não se passe nada - mas não o disse, seria imprudente da minha parte. Então Ro...
Translated from
SR
to
PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Jasna Dimitrijević