Published Texts
Welcome to our publication platform! You can browse and search for stories and samples from all our writers. Thanks to our translators, each story is available in Czech, Dutch, Italian, Polish, Portuguese, Romanian, Serbian, Slovene and Spanish. Throughout the years, this platform is becoming a growing archive of European literature by the future generation of literary artists. We're sharing stories beyond barriers.
Revolta inversa
A sua vida com Carmen Ottomany começara muito abruptamente nos finais do décimo primeiro ano. No dia em que tinha decidido deixar a cidade, procurou uma fulana alta da turma mais próxima, uma tal Fahrida (o seu pai era do Irão), mas que se apresentava como Frida. Saiu da cidade pois estava convencido de que ao partir os limites ficariam para trás, uma convicção absurda, mas se alguém nunca a tiver será digno de piedade. Foi encontrar a tal Frida entre um grupo de raparigas nas traseiras de um prédio, fumando e rindo. Fumava-se naqueles tempos, mesmo nos liceus dos snobes como era o Sub...
Translated from
RO
to
PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Cătălin Pavel
Não quero ser um cão
Escrevo no teclado: «PÔR FIM A UM DESGOSTO DE AMOR». Vejo histórias de pessoas mas não quero histórias. Quero soluções, não quero compaixão. Isto tem de parar agora. «TRANSFORMAÇÃO», escrevo. O Google diz que há transformação na matemática e na genética. Opto pela segunda e com isto faço a minha primeira escolha. Estou farta deste corpo que já foi beijado por demasiadas pessoas, que talvez até esteja estragado. Tenho sido muito imprudente com ele, demasiado descomprometida, tem de acabar, tem de ser outro e melhor. Transformação genética. «Cura com sumos» aparece no ecrã. «Transforma-te numa v...
Translated from
NL
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Alma Mathijsen
O metro
Na segunda-feira de manhã ouvi o metro chegar à estação no momento em que introduzia o bilhete na máquina e, embora ainda não estivesse atrasado e mesmo que estivesse, não havia problema, embora estivesse abraçado pelo desejo absoluto de apanhar aquele metro, um desejo não tanto como uma vontade, mas como um anseio bizarro de vingança, lançou-se pelas escadas abaixo. Aconteceu algo muito curioso. Assim como se diz que quando se morre, toda a vida te passa pela frente dos olhos, naqueles breves segundos de que precisou T. para saltar os degraus, toda a sua vida lhe passou pela mente a uma veloc...
Translated from
RO
to
PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Cătălin Pavel
Pássaros que cantam o futuro
Parece uma mistura impossível de coruja, morcego, pinguim e texugo; tem a pelagem azul, os olhos grandes e vermelhos, o bico amarelo; não tem mãos mas sim duas asas pequenas que se acionam ao ligá-lo.
Feliz aniversário, diz ela.
Noa pensa que a compra valeu a pena, ainda que tenha ultrapassado um pouco o seu orçamento. Precisou de dez mesadas para reunir o dinheiro mas, agora, ao vê-lo a ele tão entusiasmado, alegra-se por ter renunciado ao cinema, ao parque de diversões e, inclusivamente, à pista de bólingue das Sextas-feiras com as suas amigas.
Daniel segura o boneco como se fosse algo v...
Translated from
ES
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PT
by Miguel Martins
Written in ES by Alejandro Morellón Mariano
O regresso
As coisas descarrilaram em agosto, num domingo de manhã, quando os primeiros transeuntes da Place du Parvis Notre-Dame, empregados dos cafés da zona, viram o objeto, algo como uma bala gigantesca assente no solo com a ponta virada em direção à catedral e a parte traseira na direção da esquadra de polícia. Numa primeira estimativa, o projétil media por volta de vinte metros de comprimento e cinco de diâmetro. Os empregados de mesa e de bar aproximaram-se com curiosidade, deram uma volta, encolheram os ombros e foram abrir os restaurantes. Isto foi por volta das sete.
Por volta das oito, os pad...
Translated from
RO
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PT
by Cristina Visan
Written in RO by Alexandru Potcoavă
A Tapioca
Foi o ronco do motor da carrinha da associação que anunciou que era hora de almoço naquele dia em que o sol de tanto queimar não se via. O velho estava debaixo da figueira, envergando uma camisa muito suja toda desabotoada, com um riso irónico na boca fechada para segurar o cigarro. Ficou a ver a brasileira - duas grandes manchas de água debaixo dos braços e as costas da farda igualmente ensopadas - sair do veículo; ir buscar as marmitas e dirigir-se para o anexo que funcionava como cozinha onde era hábito ele estar.
— Tio João! Tio João!
O riso a contrair todas as rugas do rosto, abrindo re...
Written in PT by Daniela Costa
A ponte
Todas as estações de comboio têm um relógio. Na verdade, têm mais do que um. Em cima da bilheteira fica o principal. Depois, na gare de embarque, estão os mais pequenos. Os úteis, pois são cúmplices da nossa preguiça em tirar o telemóvel do bolso ou consultar o relógio de pulso.
As crianças ficam fascinadas por estes relógios. Como o ponteiro dos segundos roda sem parar, acaba por ser o único momento em que conseguem ver o tempo a passar. Olham o ponteiro a subir e, à medida que se verticaliza, os seus coraçõezinhos batem mais depressa e os olhos esbugalham-se. Quando, por fim, o indi...
Written in PT by João Valente
Diário da Vida
17
22 de dezembro de 2014. Diário da Vida
A aparência irreal da Praça de Espanha na fotografia impressionava com magnificência da civilização anterior já despida do seu sentido. Para que é que uma potência colonial necessita de uma praça tão tamanha, concebida para as festividades de outrora, decorada com os nichos pretensiosamente dedicados cada um a uma província espanhola? As carruagens circulavam ao redor da fonte, oferecendo aos turistas uma amostra barata da pompa da nobreza antiga. Pelo menos não se veem os segways por aqui. Um cavalo aproveitou-se do descuido do cocheiro, ...
Translated from
SR
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PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Marija Pavlović
De regresso a casa
Quando voltam a entrar no carro, deixando a cidade, ele tenta desdramatizar dizendo que foi uma daquelas situações impossíveis, que designa por Que-farias-tu-se?
Ela anui. — Essas situações não são o teu forte — comenta.
— O que é que queres dizer com isso? Não sei que porra mais deveria ter feito?
— Não digas asneiras. O Matteo repete tudo o que tu dizes.
Alice dá uma espreitadela atrás de si. Matteo vai derreado na cadeirinha.
— Podes dizer-me o que fiz de mal? — pergunta ele passado algum tempo.
— Davide, perdeste as estribeiras, desataste aos murros ao vidro. Se não tivesse sido eu, ...
Translated from
IT
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PT
by Vasco Gato
Written in IT by Fabrizio Allione
Os Meninos Escritores
Quase tudo o que aconteceu nesse dia passa-se aqui. Estou com o indicador apontado à cabeça. Muitos anos depois, enquanto levo o meu filho a descobrir o gelo, ainda recordo todos os acontecimentos daquele único dia como «o fuzilamento».
Ninguém morreu. As pessoas eram perigosas, especialmente as crianças pequenas, penduradas nas árvores. Os pés a balançar — e era da língua no meio da boca que viriam os piores crimes.
Ouvir dói, caminhar é um truque. Caminhemos.
Mesmo os pequenos ditadores envelhecem. Os filhos coabitam a terra com os pais, há milhões, talvez milhares de anos. Imagin...
Written in PT by José Gardeazabal
Clarões
Numa coletânea de ensaios intitulada O Zen e a Arte da Escrita, Ray Bradbury escreve que, dos vinte e quatro aos trinta e seis anos, passou o tempo a anotar listas de substantivos. A lista dizia mais ou menos assim:
O LAGO. A NOITE. OS GRILOS. A RAVINA. O SÓTÃO. O RÉS DO CHÃO. O ALÇAPÃO. A CRIANÇA. A MULTIDÃO. O COMBOIO NOTURNO. A SIRENE DOS NEVOEIROS. A FOICE. O CARNAVAL. O CARROSSEL. O ANÃO. O LABIRINTO DE ESPELHOS. O ESQUELETO.
Ultimamente, aconteceu-me uma coisa semelhante.
Vivi numa família que me proporcionou uma boa educação e uma boa forma de estar no mundo, mas ultimamente tenho pe...
Translated from
IT
to
PT
by Vasco Gato
Written in IT by Sara Micello
Diário de Bordo de Um Último Dia
I suppose, I said, it is one definition of love,
the belief in something that only the two of you can see.
Rachel Cusk, Outline
Pela enésima vez, proíbe-me de retirar o mapa da ilha da minha mochila. «Assim, parece que somos turistas», diz ela.
«Mas nós somos turistas, ou não?», pergunto eu.
Ela não dá resposta, mas fica a olhar para o ecrã do telemóvel com as sobrancelhas franzidas.
Uma pessoa tinha-lhe recomendado uma aplicação através da qual era possível descarregar mapas de uma área específica, para poderem ser usados offline. Pelo facto de nos guiarmos pela seta verde no ecrã de...
Translated from
NL
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PT
by Pedro Viegas
Written in NL by Lotte Lentes
O Comunismo Visto por Criancinhas
Tenho quatro anos e nunca subi mais além do primeiro andar. Estou convencido de que a serpente azul do corrimão é infindável, que ela sobe, sobe e sobe, rebenta o teto de alcatrão do nosso prédio e avança invisível até ao céu. É um pensamento que não partilho com ninguém. O meu medo aquece-se na chama deste pensamento.
As pessoas descem dos andares superiores, lá do céu, por vezes falam entre elas em surdina e não oiço o que dizem. Mas nunca há um silêncio combinado entre elas. Nunca há silêncio. Os murmúrios flutuam de uma para outra. São como algumas abelhas ou talvez como algumas mo...
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RO
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PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Andrei Crăciun
Depois da Última Ceia
Têm sido dias fantásticos. Morrer é assim, lembro-me de cada minuto. É como se estivesse deitado sobre o mapa do agora, em alto relevo. Estou de costas, para sentir cada pico de montanha, cada vale, todas as planícies. A vida não corre para a frente nem para trás, é só agora, agora, agora. Ao fim de algum tempo sinto uma dor extremamente localizada, tal qual um punhal, e fico extraordinariamente acordado, como no instante em que o juiz me condenou à morte. Morrer é assim, acontece várias vezes, mas uma delas é a definitiva. A sensação de fim pode durar muito tempo, comigo dura desde o anúncio ...
Written in PT by José Gardeazabal
Para não Te Ver
Já sabes que levei os miúdos, as roupas, as coisas do banho, a comida biológica dividida em pequenas porções dentro de tupperwares de cores berrantes como as da Benetton, levei também os livros deles, porque de noite é só pela leitura que consigo convocar o sono do Rogério, e não raras vezes ele acorda horas depois com um pesadelo a esganar-lhe a maçã-de adão, e eu abraço-o, como te abraçava, Rita, quando fazíamos um ninho tão perfeito que quem nos visse de cima poderia facilmente confundir-nos com um daqueles símbolos chineses a preto-e-branco onde se vêem explicados a imortalidade e o...
Written in PT by Valério Romão
Não Deem Comida aos Macacos
Luz estava há mais de meia hora à espera ao sol. De vez em quando, percorria o passeio de um extremo a outro para desentorpecer as pernas e aliviar o peso da barriga. Os seus olhos moviam-se com rapidez entre os carros que circulavam pela avenida, especialmente quando se ouvia uma aceleradela. Mas nada.
Decidiu refugiar-se do calor debaixo do beiral do edifício. Foi então quando, de trás de um autocarro, apareceu ziguezagueando o pequeno carro vermelho. Luz viu como Jaime travava bruscamente e se punha a tocar a buzina repetidas vezes, como se estivesse há muito tempo à sua espe...
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ES
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PT
by Matias Gomes
Written in ES by Roberto Osa
Parêntesis
Suponho que nem o que temos de mais fiável - os sentidos, isto é, o que vemos, ouvimos, aquilo de que nos apercebemos com o corpo - é fiável em situações como a morte de um pai, o nascimento de um filho ou estar prestes a morrer atropelado. Agora, que já enterrámos o papá, e estou por fim sozinho com os meus pensamentos, constato que ontem, no tanatório, tal como há trinta anos atrás, o tempo parou. Por uns segundos, sim. Mas aconteceu outra vez. E soube, imediatamente, que se tratava do mesmo fenómeno que vivi em criança.
Naquela noite também estava com o papá.
Aconteceu...
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ES
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PT
by Matias Gomes
Written in ES by Mariana Torres
Mudar de ideias
A Maixa recomenda-me que pronuncie todas as sílabas, sem me armar em londrina, que não me alongue muito no enquadramento teórico, que experimente o equipamento informático antes de começar a defesa, que seja humilde, que tome nota das perguntas e sugestões do júri e que os convide para almoçar num restaurante de menu fixo. A June opina que isso do menu é muito foleiro e sugere-me um refeitório na faculdade, uma citação de Weber, meio Lexatin ao pequeno-almoço e dar-me boleia até Gasteiz. Aceito a bibliografia e o transporte.
Saímos de Bilbau com a minha mãe, a minha prima e o meu namorado co...
Translated from
ES
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PT
by Miguel Martins
Written in ES by Aixa De la Cruz Regúlez
Amanhã
Deitada de costas, no conforto macio dos lençóis, com os olhos fixos num ponto invisível do tecto do quarto,
Carlota tentava a custos regular a respiração que se mantinha alterada desde que o sonho ansioso que estava a ter a despertou. Já nem se lembrava do que realmente estava a sonhar, só se recordava da sensação desesperada que a obrigou a acordar. E, desde esse despertar abrupto a meio da noite, que ela tentava, de todas as maneiras que conhecia e se lembrava, baixar o ritmo cardíaco, até aquele momento sem sucesso. Desistiu, empurrou a coberta para trás e levantou-se da cama, sem antes o...
Written in PT by Patrícia Patriarca
O Sol quando Cai
I
Na manhã de 11 de julho de 1978, parte em direção a Barcelona um camião com um carregamento de propeno líquido. O camião vem de uma pequena cidade na Catalunha e é conduzido por um motorista que, no meio da sua cara brilhante, usa um grosso bigode. Já trabalha há vinte anos para a mesma empresa, com o mesmo camião, e conhece a rede rodoviária de Espanha de cor. Para evitar portagens, escolhe sempre as estradas interiores.
As botijas de gás não foram feitas para ficar muito tempo ao sol, e uma enorme cisterna com vinte e cinco toneladas de propeno, apesar de só poder conter dezano...
Translated from
NL
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PT
by Xénon Cruz
Written in NL by Joost Oomen